Jorge Koyama

Jorge Tadashi Koyama, natural de Assaí, no estado do Paraná, é filho de descendentes de japoneses. Seu pai, imigrante de Osaka, Japão, chegou ao Brasil em 1930. A família, composta por cinco irmãos, vivia da cultura do café, algodão, milho e criação de porcos. 

“Com 8 anos de idade, eu acordava todos os dias muito cedo para alimentar os porcos e limpar os cochos de água, tínhamos umas 80 cabeças. Este era meu serviço antes de ir para a escola. Tive uma infância difícil, mas agradeço a Deus pelo que tenho hoje.”

Quando ainda era jovem estudante com 19 anos, Jorge tinha o sonho de fazer faculdade de agronomia, mas seu pai não tinha condições de mantê-lo no ensino superior. Frustrado com a decisão, ele não discutiu com o pai, mas fez uma promessa para si

 “Naquele dia, decidi que, com estudos ou sem estudos, eu seria o melhor de todos.”

Jorge Koyama

O seu destino mudou ao assistir ao Globo Rural em 1981, quando se deparou com uma reportagem sobre os primeiros plantios de soja no Oeste da Bahia. Essa foi a primeira vez que ouviu falar daquela região. Por volta de 1982, uma corretora de Cascavel estava negociando terras no Oeste da Bahia, adquiridas pela família Nogueira. Essa oportunidade surgiu para a família Koyama expandir suas terras e plantações. 

Durante a colheita do trigo no Sul, Jorge não conseguiu viajar para ver as terras, cabendo ao seu irmão Júlio Koyama essa missão. Nessa ocasião, adquiriram 1830 hectares de terra, pagando em média meio saco de soja por hectare. Eles enfrentaram obstáculos para obter financiamento bancário, devido ao baixo valor das terras. Seu irmão, Júlio, foi responsável pelo primeiro financiamento, utilizando as terras remanescentes no Paraná como garantia. 

Em 1984, uma parte da família Koyama decidiu se mudar para a região do Oeste da Bahia. Jorge levou dois tratores CBT ano 1974 e dois caminhões com seus pertences e maquinários. Neste ano, enfrentaram diversos desafios, como a falta de estradas, energia elétrica e até mesmo um local para se abrigarem. Eles abriram um espaço para o desembarque e começaram a construção de sua primeira moradia. O rio mais próximo ficava a 13 quilômetros de distância, e a água era buscada em uma pipa. A energia elétrica só chegou em 2005, adquirida com recursos próprios, dividindo os custos entre os moradores vizinhos.

Antiga ponte de acesso às propriedades da família Koyama – Reprodução: Acervo Koyama

A comunicação na região era limitada ao rádio amador, uma ferramenta essencial para contato com parentes e solicitação de peças para maquinários agrícolas. A manutenção destes equipamentos era realizada pelos próprios produtores rurais que foram aprendendo conforme as necessidades da fazenda, quase sempre as adaptações eram necessárias pois não havia máquina apropriada ou desenvolvida para o trabalho no cerrado, condição completamente diferente da região sul do país. 

“A oficina mais próxima era na cidade de Barreiras, e não supria todas as necessidades, daí tinha que pedir peças em outros estados como Goiás, Paraná e Rio Grande do Sul.”

Jorge Koyama fala sobre as semelhanças entre as promessas feitas durante a abertura de fronteiras agrícolas, tanto no passado quanto nos dias atuais. Ele compartilha a história de seus pais, imigrantes japoneses, que vieram ao Brasil inicialmente por causa da cultura do café em São Paulo. A propaganda prometia oportunidades de ganhar dinheiro com o café. Seus avós vieram com a intenção inicial de ficar por alguns anos, adiantar dinheiro e retornar ao Japão. Ele compara essa experiência com a migração para o Oeste da Bahia, uma fronteira agrícola, distante dos grandes centros urbanos, não havia o conforto da cidade, apenas a promessa de crescimento. Muitas pessoas tiveram desilusões, mas ele decidiu vir sozinho, sem sobrecarregar outros familiares. 

Ele compartilha que, inicialmente, sua preocupação ao se estabelecer na região era garantir seu patrimônio. Ele temia o fracasso e a possibilidade de perder não apenas seus investimentos, mas também o patrimônio familiar vindo do Paraná. Seu irmão expressou que, no início, enfrentaram dificuldades, especialmente por não terem tradição na região.

Jorge Koyama se casou em 1987, ele conheceu a sua esposa em um clube de jovens na Associação Comercial e Empresarial de Palmital no Paraná. Logo após o casamento, eles viajaram rumo ao Oeste da Bahia. Assim que chegou, a esposa dele teve uma primeira impressão ruim, especialmente devido às condições iniciais da casa, que era uma construção pré-moldada. Na época, ainda não havia poço artesiano, então a água era obtida diretamente do rio. 

Casa pré-moldada de madeira com 60m² – Reprodução: Acervo Koyama

Jorge Koyama deu início ao primeiro plantio de soja em 1985, enfrentando desafios devido às diferentes condições de solo e clima em comparação ao Paraná. A variedade Tropical foi a única opção na época, produzindo 21 sacos por hectare. Nos anos seguintes, novas variedades foram introduzidas, como “torco” e Paraná goiana. Ele destaca a necessidade de adaptar a tecnologia, como a quantidade de inoculante utilizado nas culturas. 

Quanto ao sistema de plantio, ele destaca as diferenças entre o Paraná e a região, explicando que no Oeste da Bahia, devido às características do solo, o plantio direto foi adotado mais tarde. Ele descreve a transição gradual para o plantio direto, inicialmente testado em pequenas áreas até sua plena implementação.

O entrevistado compartilha sua visão sobre a cultura do algodão, destacando os desafios específicos dessa atividade. Ele destaca a necessidade de uma cadeia completa para o sucesso dessa cultura, desde o plantio até o beneficiamento. Além disso, Koyama analisa a dinâmica do mercado agrícola na região, ressaltando a importância do alimento na visão japonesa pós-guerra.

Colheita de soja – Reprodução: Acervo Koyama

Ao longo do tempo, superando os desafios iniciais, a infraestrutura na região melhorou significativamente, impulsionada por parcerias estabelecidas com cooperativas de produtores rurais. Em 1985, uma colaboração importante foi formada com a Cooperativa Agrícola de Cotia (CAC). As famílias que migraram com os Koyama, então associadas, consolidaram parcerias regionais no Oeste da Bahia para aquisição de insumos essenciais, como calcário, adubo e sementes. Além disso, o transporte de produtos incluía a venda de arroz para a cooperativa, fortalecendo ainda mais os laços colaborativos.

Fundada em 1927, a Cooperativa Agrícola de Cotia (CAC) permanece até hoje como uma das iniciativas mais prósperas da comunidade japonesa no Brasil. Sua expansão não se limitou a isso. Em poucas décadas, a cooperativa diversificou sua produção e inaugurou filiais em Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro. Na década de 1980, a CAC contava com 15.000 associados distribuídos por catorze estados brasileiros, alcançando um faturamento anual de 760 milhões de dólares.

A Cooperativa Cotia, fundada em 1927 – Reprodução: Acervo do Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil

A Cotia tinha uma conexão histórica com a abertura das fronteiras agrícolas no Cerrado brasileiro. Em 1973, o então Secretário de Agricultura de Minas Gerais, Alysson Paolinelli, fundou o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba (PADAP) em colaboração com a Cooperativa Cotia. Esse projeto se tornou um modelo para a criação de outros programas de colonização agrícola no Cerrado brasileiro, incluindo no Mato Grosso e vários outros estados.

Em 1987, a região também testemunhou a atuação da Coaceral – Cooperativa Agrícola do Cerrado do Brasil Central. Fundada para apoiar as ações do Prodecer II – Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados, financiado pelo Japão por meio do Jica (Japan International Cooperation Agency). O programa, coordenado pela Campo – Companhia de Promoção Agrícola, uma holding formada pelos Governos do Brasil (51%) e Japão (49%), contou com a participação de órgãos públicos como Embrapa, Senar, Desenbanco. O Prodecer abrangeu 07 estados (MG, GO, MS, MT, BA, MA, TO).

Ao abordar o impacto da cooperativa Cotia na região, Koyama ressaltou inicialmente os benefícios que a chegada da cooperativa trouxe para os agricultores locais. A centralização de recursos e a facilitação das negociações proporcionaram uma estabilidade antes desconhecida pelos produtores. Em 1988, Jorge Koyama foi reconhecido como o melhor produtor de arroz pela Cooperativa Agrícola de Cotia.

Contudo, a mudança na diretoria e a perda de confiabilidade acabaram por desencadear a crise que culminou no fechamento da Cotia. O relato detalhado de Koyama sobre os bastidores desse processo revela a complexidade das relações no mundo cooperativo. Mudanças políticas e econômicas, exemplificadas pela instabilidade ministerial e pelo plano econômico da época, contribuíram para a deterioração da Cotia. 

O fechamento da Cotia, longe de representar o fim da jornada agrícola dos cooperados, marcou o início de uma nova fase desafiadora. A criação da Cooproeste (Cooperativa Agropecuária do Oeste da Bahia), uma iniciativa liderada pelos próprios agricultores, destaca-se como um exemplo notável de resiliência e capacidade de adaptação. A decisão de formar uma nova cooperativa demonstra não apenas a determinação em superar adversidades, mas também a compreensão da importância das cooperativas na estabilidade financeira e comercial dos produtores.

As dificuldades financeiras enfrentadas durante essa transição são particularmente destacadas no relato de Koyama. As negociações com instituições financeiras e a necessidade de oferecer garantias para levantar fundos revelam a complexidade de gerir uma cooperativa e as interconexões entre o setor agrícola e o sistema financeiro.

Ao assumir a presidência da Cooproeste, Koyama evidencia seu compromisso e liderança na consolidação dessa nova cooperativa. A continuidade do sucesso da Cooproeste não apenas preserva a tradição cooperativa na região, mas também reafirma o papel vital que essas organizações desempenham na vida e no sustento dos agricultores.

Hoje com 120 cooperados, a Cooproeste já chegou a atingir seu auge com quase 1000 cooperados. Koyama destaca uma fase crucial relacionada ao algodão e às mudanças nas políticas fiscais, que impactaram diretamente a dinâmica cooperativa. A Cooproeste oferece serviços que abrangem o fornecimento de insumos, apoio à comercialização e assistência técnica. A diversificação dos serviços reflete uma abordagem mais flexível e adaptativa, reconhecendo as demandas dos agricultores.

A trajetória da Cotia, apesar dos desafios enfrentados, serviu como um aprendizado para a estruturação da Cooproeste. A atuação da Cooproeste hoje vai além dos aspectos comerciais, estendendo-se à vida familiar de Jorge Koyama. Seus filhos assumem posições estratégicas na gestão e sucessão da fazenda, com a filha Andressa encarregada da parte financeira e o filho César demonstrando interesse nas atividades de mercado. O planejamento de sucessão é um elemento vital para a sustentabilidade do negócio agrícola.

Jorge Koyama e a sua família – Reprodução: Epopeia do Agro

Ao discutir a realização de seu sonho, Jorge Koyama não apenas atesta a concretização desse objetivo, mas também destaca o valor da persistência. Seu envolvimento direto nas operações cotidianas, como o plantio noturno, reflete uma dedicação contínua à fazenda. A visão do futuro da Cooproeste é moldada por essa mentalidade resiliente, com a próxima geração preparada para enfrentar desafios e continuar o legado cooperativo.

“Já fui confundido com os funcionários na plantação, mas isso não me impede de dirigir o trator e plantar. Costumo trabalhar até às 11 da noite durante o plantio, encerrando a colheita por volta das 7:00. Em algumas ocasiões, inclusive durante três noites seguidas, enfrentei o desafio de trabalhar sozinho na plantação. Uma vez, um funcionário comentou sobre minha idade, insinuando que não deveria plantar tanto, mas levei na brincadeira. Mesmo plantando o dia inteiro e durante a noite, às vezes retornando para casa às 3 ou 4 da manhã, nunca desisti desse compromisso e continuo firme até hoje.”

Jorge Tadashi Koyama, descendente de japoneses de Osaka, contribuiu para o desenvolvimento da agricultura no oeste da Bahia. Durante a entrevista com a equipe Epopeia do Agro, a família Koyama compartilhou fotos antigas que retratam a vida naquela epoca. Confira essas imagens exclusivas no acervo do site.

Para mais histórias sobre imigrantes japoneses no cerrado, sugerimos a leitura da entrevista com Adilson Suzuki, um dos jovens que chegou pelo Prodecer na década de 1980. Clique aqui e embarque nessa jornada.

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