Antônio Guadagnin

A Região hoje está em franco desenvolvimento, mais importante é que a história ensina

Antônio Guadagnin

Antônio José é paranaense, descendente de imigrantes italianos do Paraná-PR (Famílias Guadagnin e Borgani, de origem siciliana). Formado em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal do Paraná (1978). Em 1978, iniciou a sua carreira como Engenheiro Agrônomo trabalhando numa grande Cooperativa no Oeste do Paraná, no Município de Marechal Cândido Rondon. Em 1979, como funcionário da Emater(DF), foi trabalhar no Programa de Assentamento Dirigido da Secretaria de Agricultura de Brasília (PAD-DF), onde conheceu a tecnologia desenvolvida no CPAC (Centro de Pesquisa Agropecuária do Cerrado), da Embrapa, para o cultivo de grãos no Cerrado brasileiro. 

Os produtores rurais que tiveram as suas terras desapropriadas durante a construção da barragem de Itaipu no Paraná foram selecionados estrategicamente para compor o programa. Em entrevista, Antônio conta que o seu interesse pelo Cerrado surgiu quando ainda era jovem, prestes a concluir sua graduação:

“Eu coloquei uma coisa na cabeça, eu não tenho nada contra quem é empregado, mas o meu espírito, eu queria um pedaço de terra pra plantar. Então, eu fui conhecer o Mato Grosso-MT, nós pegamos, cada um,  uma mochila, colocamos um pouquinho de dinheiro que a gente poupou, pra poder ter segurança de algum problema de doença, de alguma coisa que precisasse, e entramos pelo Mato Grosso, subimos, aquele ano o Exército tava fazendo já a BR-163, que saía lá  em Itaituba-PA; tava em construção, não passava ainda ninguém, nós pegamos carona do Exército; enfim, saímos lá no Amazonas, fomos conhecer a Amazônia, onde a gente passava que encontrava um solo que a gente achava, coletava amostra; descemos pra Porto Velho-RO, fomos pro Acre, que Acre tem terras maravilhosas, tem áreas fertilíssimas.

Depois de formado, o agrônomo trabalhou durante um ano na Cooperativa do Paraná, acumulando experiência para iniciar a sua empreitada no Cerrado. Graças a sua dedicação profissional, ele teve um rápido crescimento na carreira:

“Eu fui convidado pra vim pra cá como um agrônomo, para vir transferir a tecnologia da Embrapa pra eles, porque tinha que ser um Agrônomo que também tinha a mesma índole, o mesmo sotaque, o mesmo jeitão, que sabia lidar com esse povo lá do Sul

O agrônomo conheceu o Oeste da Bahia no final de 1979, junto com o colega de trabalho, Hilário Kappes, e o agricultor Constantino Catarino de Souza (pai de Jusmari Oliveira), em busca de terras para iniciar o plantio pioneiro de grãos no Cerrado. Como ainda estavam trabalhando em Brasília, precisavam viajar à noite durante os finais de semana. Constantino foi quem vislumbrou a riqueza naquelas terras desertas:

“Luís Eduardo só tinha uma casinha de pau a pique, que tinha um senhor, o negão chamavam, que vendia charque de ema; não é, e café, nem cachaça não tinha. Só tinha isso lá. Essa era uma fazendo muito grande, na época, chamava Fazendo Mimoso. Era uma fazenda com 170.000 ha que tinha problemas fundiários de documentação, tinha a briga de interesses; então tava tudo parado. E, era um deserto, só tinha de lá, aqui nos gerais, só tinha esse ponto de apoio, que seria nesse senhor, e tinha um posto na Roda Velha.

Em 1980, Antônio decidiu se mudar com a família, levando sua esposa e seu primeiro filho. Comprou um trator pequeno e os equipamentos básicos para começar com o cultivo do Arroz:

Para mim, foi a primeira lavoura, foi uma alegria, nunca tinha tido um trator, vim de uma origem muito pobre. Nós, então, começamos a preparar a terra.

No início não havia equipamentos agrícolas, sementes nem adubos. Tudo precisava ser comprado em Goiânia (GO). A escolha do cultivo de arroz é porque havia limitações de insumo para correção de solo, mas, logo em seguida, sanada essa questão logística, de fornecimento do calcário necessário, iniciou o plantio pioneiro de soja no Oeste da Bahia.

“Eu acho que é bom contar um pouco da história. A Região hoje está em franco desenvolvimento, ainda tem muito pra frente, muita coisa a fazer, o mais importante é que a história ensina, principalmente, para essas gerações novas que estão vindo:  houve muito empreendedorismo, muita coragem, muito empenho mesmo desses empreendedores”

 

Entrevista na Bahia Farm Show em 2022

Para conseguir maior investimento do Banco do Brasil, Antônio abriu uma empresa de planejamento para assessorar os agricultores que vinham do Sul, sem conhecimento técnico das condições de plantio do solo. Enquanto trabalhava nos projetos de assistência, seus irmãos ajudavam a administrar as lavouras da fazenda. A cada dia crescia a expectativa de conseguir um retorno financeiro por meio dos primeiros plantios de arroz.

Entretanto, naquele ano houve uma seca que acometeu toda a região do Nordeste. Foram muitos hectares perdidos junto com a esperança dos jovens agricultores. Antônio lamenta ao lembrar que o seu vizinho Hilário Kappes perdeu tudo na época. Os agricultores acionaram o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), um seguro para cobrir as perdas agrícolas. Estavam prestes a perder a credibilidade do banco quando surgiu a ideia de organizar uma reunião com a sociedade e o gerente do Banco do Brasil, Pedro Guedes.

Daí nós não entramos pela frente da fazenda; ia passar e ver que tinha perdido 160 hectares; entramos pelos fundos. Só apresentamos 40 hectares, tava amarelo que nem esse piso aqui; coisa mais linda, amarelo, parecia ouro, porque produziu bem! Deu 33 sacos; pra uma terra que não valia nada, aquilo foi um bum!

Entusiasmado com o sucesso da colheita, Pedro Guedes disse: “Pra mim, isso aqui basta, daqui pra frente, o agricultor que quiser plantar no Cerrado, as portas do Banco do Brasil estão abertas”. Após essa empreitada arriscada, Antônio decidiu seguir com a cultura da soja que garante uma maior segurança. O desafio agora era conseguir calcário para plantação, pois o banco ainda não financiava esse tipo de insumo agrícola na região do cerrado baiano. Era preciso incluí-lo no Manual de Crédito Rural (MCR), documento que reúne as regras estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco do Brasil relacionadas ao crédito rural.

Os agricultores do oeste baiano buscaram apoio com o deputado baiano Prisco Viana, na época Presidente do PSD, partido com muita influência política. Prisco Viana exerceu 10 mandatos de Deputado Federal pela Bahia e foi Ministro de Estado do Governo Sarney. Em 1982, o deputado autorizou a adição de calcário vindo da cidade de Brasília(DF) e posteriormente de Maruim ao lado de Aracaju (SE).

Em 1983, Antônio conseguiu iniciar o primeiro plantio de soja totalizando 200 hectares. Ele relembra como a região estava isolada, precisava se deslocar para comprar os produtos, as máquinas agrícolas eram antigas e demoravam para semear. 

“Aqui não tinha telefone pra fora, só tinha um posto de serviço. Você tinha que entrar na fila, uma menina atendia, marcava o teu telefone, ia chamando um por um, ia pra cabine, levantava o telefone, e assim que a gente falava pra fora. Aqui não tinha panificadora, não tinha açougue, tinha só um mercado, muito horrível mesmo, tinha supermercado, mas assim, o mínimo necessário, a Cidade tinha 15.000 habitantes, e a estrutura, o básico de uma cidade do interior. Nós estávamos muito longe de Salvador-BA, tinha 200 km de chão

Foi necessária muita coragem para superar esses desafios, seja pela falta de infraestrutura, de estrada, falta de fornecimento de insumos e máquinas. Os agricultores foram afetados principalmente pelo fracasso dos planos econômicos instaurados pelo governo federal: Plano Cruzado, em 1986; Plano Bresser, Plano Verão I, Plano Verão II, e, depois, o Plano Collor, em 1990. Era difícil não ficar desanimado, Antônio relata “nós tivemos uma inflação de 89%, com 3% de inflação ao dia. […] Eu plantava cinco pivôs, gastava 5.000 litros de óleo diesel por dia; e eu amanheço com 50 reais na conta”.

Existia uma pressão para que as colheitas dessem certo, mesmo que para isso os agricultores precisavam investir todo o seu patrimônio. Aos poucos Antônio conseguiu comprar mais terras, aproveitando a sua renda da empresa de planejamento e o seu conhecimento como agrônomo para produzir sementes.

Os militares, quando montaram a EMBRAPA, eles pegaram mais de 1.000 técnicos e mandaram pra fora do Brasil, fazer pós-graduação, e um desses foi estudar nos Estados Unidos, justamente, sobre sementes, e eu tive a graça; a felicidade de ser um aluno da produção de sementes, que é uma tecnologia, hoje é fácil,  todo mundo sabe, mas na época, nós era um País que tava vindo de plantio só de pequenas lavouras

Na Bahia ainda não havia a tradição de grão, então quem chegou na região descobriu tudo de forma empírica. Apenas alguns anos depois foi formada uma associação de produtores de sementes, Antônio foi presidente por muito tempo. Graças ao pioneirismo, hoje a região oeste tem grandes produtores, exportando sementes para o Brasil inteiro.

Nessa trajetória, o agrônomo ajudou muitas famílias vindas do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. É o caso da família Schmidt, Antônio fez o projeto da primeira lavoura de soja plantada nos 200 hectares da fazenda.  

 

Antônio e a esposa durante a entrevista em 2022

No final desta primeira parte da entrevista, a equipe Epopeia pediu para que o entrevistado enviasse um recado para as gerações futuras sobre a sua vivência no Cerrado:

“O Brasil é agro, nós temos tecnologia e precisamos acreditar buscando cada vez mais. O jovem tem que estudar, tem que se dedicar, tem que ser um empresário. […] o Brasil é que vai alimentar o mundo, nós temos um potencial muito grande!

Gostou desse post? Venha conferir a história do agrônomo Hilário Kappes, entenda como a sua trajetória está ligada ao relato do Antônio Guadagnin.

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